ou, no seu caso, a correr.
depois dos tempos de inércia, veio uma vontade danada de correr,
e aquele parecia um dia de verão qualquer.
mas não era.
nem lembrava há quantos anos não se via só
ou quanto tempo não se permitia pequenas e secretas aventuras.
seu pensamento, sempre focado no desejo do outro, ou, se não bem isso,nada focado no seu próprio desejo.
na noite anterior, calor, tanto calor que nada podia tocar o corpo, deitada
escutava suas músicas prediletas, cada música uma lembrança,
algumas intensas, outras divertidas, lembrava e
sorria ao lembrar, deixou fluir,começou a lembrar detalhes
e, lentamente, permitiu se dar prazer,
resgatava nela a capacidade de se tocar, ritmar, sentir, lembrar, molhar, gozar
carinhos com música, carinhos em todo o corpo,
sentindo cada toque.
depois a paz, o silêncio da rua, o cantar do mar cadenciado, o sono.
porque não fazia mais vezes isso?
tão bom, tão básico, tão essencialmente feminino.
deve ser assim o encontro feminino, cuidando de cada detalhe, sentindo com o toque e pulsando, dando o ritmo.
ela sabia qual o significado.
a vivência estava nela, dentro dela.
outro dia e sair, caminhar, sentir, ir e vir,
vento forte, dia nublado, mar mexido.
resolveu gastar, exercitar, suar, se possível gritar.
e, quando, novamente com sua música, saiu a caminhar, o céu ficou azul, o sol forte, o verão pleno, vento, tanto vento que jogava os cabelos pra trás, servia de resistência, forçava cada passo, e ela, com sua música, sorria novamente,
lembrava das brincadeiras da manhã com sua filha, lembrava de amigos, amores e assim caminhou por horas, sentindo, sorrindo, feliz, plena.
era isso que precisava.
já conseguia retornar e assim o fez.
a rotina então lhe pareceu colorida, ótima.
havia dedicado horas para cuidar-se, para tocar-se.
cada dia um passo
para sentir de verdade, de dentro pra fora.
já é noite.
sorri e imagina um olhar mesclado de convicto e divagador.
ficará somente no fundo dos olhos o que dentro do corpo acontece.
ela já sabe como viver isso, um segredo entre ela e ela.
para a filha irá ensinar o que está aprendendo agora:
que sentimos de formas diferentes
que sentir não gera culpa, não tolhe
sentir liberta, faz voar, fortalece, dignifica, surpreende.
está pronta para seguir.
desliga a luz.
dorme.
quantas mulheres não se provam?
e dependem da boca do outro para saberem que sabor elas têm?
quantas mulheres não se tocam?
(texto de 2008)
Lindo filha! Cada dia me surpreendes mais.
ResponderExcluirÉ, ser mulher não é sopa! Se descobrir, não é fácil.Tocar o âmago de nosso ser e de nossas descobertas é algo a insustentável beleza.
Dou força!